quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Uma Carta

Eu que estive longe escrevo para dizer que estou voltando aos meus, aos que ficaram me despeço em uma só nota, em uma só lágrima, a lágrima de que o caminho foi longo, que o caminho foi curto, muitas vezes sem fim. Mas há e haverá ainda céu e este não se acaba.


Eu que estive longe escrevo para dizer que estou voltando aos meus, e que andei desenhando casas, nenhuma se parece com a de minha infância. Não poderia eu requerer minha casa se quando perto estive do lado de fora e quando dentro confusa e vazia. Há de se fechar com travas e tramelas e se dispor a entrar.


Eu que estive longe escrevo para dizer que estou voltando aos meus, e que andei sonhando com o que eu ainda não consigo escrever. Volto a fim de requerer o que é meu por direito e abdiquei. Se nesse caminho te encontrei, saiba que nada era meu, nem copo, nem vestes, mesmo que parecesses meus.


Eu que estive longe escrevo aos meus, para dizer que ando recordando o caminho de volta, que parti de mim em busca do que estava ao lado e estando ao lado não suportei tamanha escolha. Para longe perdi um pouco a cada dia, meus olhos, um jogo de futebol na tv, um possível melhor amigo, meu sorriso, inúmeros domingos, eu e você.

Por estar longe, e só por estar longe, pude voltar!


Em frente a minha rua, já não escrevo mais!


Observo o caminho que inúmeras vezes pensei ter passado, casas amarelas de minha lembrança, se desfaz no tempo. Flores, arvores, meus cachorros dão espaço a um caminho de pedras vazio. Nada estivera lá. Meus mortos não foram sepultados em minhas terras, o riso da criança que não nasceu, o sorriso de uma avó, um periquito, minha mãe. Nada estivera lá. No jardim o cheiro do sereno não vem.
Na porta de casa, a dor. Nada faz sentido.
Na porta de casa todas as cartas que escrevi aos meus.

Em minha casa nem eu mesma tive a chave para entrar.
Em minha casa nem eu mesma tive a chave para sair.

No escuro da sala tinta, papel e caneta. Andei escrevendo cartas.



Maysa Louzada
Novembro de 2009